sábado, 19 de novembro de 2011

É tempo de reabilitar o Dreyfus de Portugal




                                                    Capitão Barros Basto







Este ano marca o 50. º aniversário da morte de um herói anónimo judeu, Capitão Arthur Carlos de Barros Basto. As suas façanhas estenderam-se desde os campos de batalha da I Guerra Mundial até à luta que encetou para recuperar a sua identidade cripto-judaica, mas a sua actividade teve um fim cruél e injustificado nas mãos do então regime ditatorial de Portugal. 





Por Michael Freund -  (Jerusalem Post, 17/11/2011)


Apesar de terem decorrido sete décadas desde a decisão que vitimou o Capitão, a injustiça cometida contra ele ainda clama por resolução. O tempo ainda não trouxe a este homem a justiça que lhe é devida. Barros Basto é descendente de uma família de Bnei Anousim (a quem os historiadores se referem com a expressão depreciativa "marranos"), cujos ancestrais foram forçados a converter-se ao catolicismo no século 15.Educado como católico, ele tornou-se um soldado condecorado que comandou uma companhia de infantaria portuguesa na I Guerra Mundial, onde lutou nas trincheiras da Flandres e tomou parte na ofensiva dos Aliados para libertar a Bélgica.Depois da guerra, Barros Basto decidiu voltar a abraçar a fé judaica de seus antepassados. Para tanto, estudou intensamente o judaísmo e viajou para Marrocos, em dezembro de 1920, a fim de fazer o retorno formal ao povo judeu, diante de um tribunal rabínico.De regresso a Portugal, Barros Basto instalou-se na cidade nortenha do Porto, onde lançou uma campanha pública para persuadir outros Bnei Anousim a retornarem às suas raízes judaicas.
Envergando o 
seu uniforme militar e as suas medalhas, Barros Basto viajou por cidades e aldeias do interior de Portugal, discursando, realizando serviços judaicos, e procurando inspirar outros a seguir o seu exemplo. Depois de séculos de clandestinidade, milhares de Bnei Anusim responderam ao seu chamamento e aceitaram juntar-se ao seu movimento.Barros Basto pediu apoio aos judeus de todo o mundo, e conseguiu angariar os fundos necessários para construir a sinagoga Mekor Haim, uma sinagoga magnífica que ainda existe na cidade do Porto. Inaugurou uma yeshiva (escola judaica) que operou durante nove anos, tendo como alunos dezenas de jovens Bnei Anousim. Ele também produziu, sozinho, um jornal judaico, o Halapid, e foi responsável pela publicação de vários livros em português sobre história e lei judaica.No entanto, a sua aberta identificação com o judaísmo e os milhares de pessoas que inspirou mereceram a hostilidade do governo e das autoridades da Igreja, que procuraram pôr um fim no seu movimento nascente, processando-o por acusações relacionadas com a prática da religião judaica. Em 12 de junho de 1937, o Conselho Superior de Disciplina do Exército Português concluiu que Barros Basto não tinha a "capacidade moral" para servir nas suas fileiras.E o que foi exactamente o seu "crime"?Incrivelmente, o Conselho declarou que Barros Basto tinha "realizado a operação de circuncisão a vários alunos, seguindo um preceito da religião israelita que professava" e também que ele se revelava excessivamente carinhoso com os seus alunos.Em consequência, os militares expulsaram-no sumariamente das forças armadas, destruindo a sua carreira e manchando o seu nome. Isso pôs fim aos seus esforços para despertar os Bnei Anousim de Portugal, porque muitos viram no tratamento dado a Barros Basto um sinal claro de que as autoridades não tolerariam o seu retorno ao judaísmo.Em 1961, o Capitão morreu na tristeza total. Destituído do seu posto e humilhado publicamente pela simples razão de ser judeu, Barros Basto foi comparado por historiadores como Cecil Roth a Alfred Dreyfus, o oficial francês que, em 1884, sob falsas acusações, foi condenado por traição e expulso do Exército. 
Porém, ao contrário de Dreyfus, Barros Basto ainda não recebeu a exoneração que tanto merece.
No ano de 1975, depois de 
Portugal ter feito a sua transição para a democracia, a família de Barros Basto apelou às autoridades para corrigirem a situação, mas os seus apelos caíram infelizmente em saco roto.Na última década, a Shavei Israel envolveu-se no caso Basto Barros e, com o apoio deorganizações judaicas americanas, como a Conferência dos Presidentes, a União Ortodoxa e os Sionistas Religiosos da América, escreveu sobre o assunto ao embaixador português em Washington.No mês passado, em 31 de outubro, houve um importante e novo desenvolvimento. Através de um advogado, a neta do Capitão, Isabel Maria de Barros Lopes, apresentou à senhora presidente do Parlamento de Portugal um pedido de reintegração póstuma do seu avô no Exército. A Isabel disse-me que está determinada a resolver as coisas de uma vez por todas. Assim como o seu avô, ela não tem medo de lutar pela justiça. Mas, deve ser exercida pressão sobre as autoridades portuguesas. Para tanto, o leitor contacte uma Embaixada de Portugal ou assine a seguinte petição online dirigida à líder do Parlamento de Portugal: http://www.thepetitionsite.com/1/pardon-Capt-Barros-Basto/
É necessário 
reunir o máximo apoio internacional possível para encerrar este doloroso capítulo da História. Barros Basto foi uma personalidade muito corajosa, que se levantou a favor do povo judeu, desafiando os poderes constituídos para ajudar os seus irmãos. Ele foi vítima de anti-semitismo. Assim, como poderemos permanecer em silêncio?Há alguns anos, numa aldeia do norte de Portugal, Amarante, eu entrei no cemitério local e detive-me sobre o túmulo simples e sem adornos de Barros Basto. Então, naquele local, eu fiz uma promessa: fazer o que eu podia para restaurar a sua honra e repor a justiça.Existe agora uma oportunidade sem precedentes de fazermos isso e não devemos deixá-la escapar. A mancha no nome deste nobre homem é também uma mancha para Portugal. É hora de a vermos removida, de uma vez por todas. É hora de reabilitar o Dreyfus Português e fazer justiça, para que a sua alma possa finalmente descansar em paz.


(Tradução do inglês: Marco Sampaio)

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